21/10/2010 / 09:18

Amália Safatle
De São Paulo

A tecnologia me permite realizar boa parte do trabalho sem me locomover e, com isso, evita aumentar minha pegada ecológica no quesito emissão de gases poluentes e de efeito estufa. Computador, celular e telefone fazem a trilogia básica da comunicação durante boa parte do tempo. Navegação, mensagens instantâneas, conferências, entrevistas por skype ou telefone. E assim é com bilhões de pessoas no planeta.

Mas nós, entre esses mesmos bilhões, descartamos todo ano 20 a 25 milhões de toneladas produtos eletrônicos (e-lixo), segundo dados do Greenpeace. Se dispostos em vagões de um trem, daria uma volta do mundo. E a taxa de crescimento dessa montanha de resíduos cresce ano a ano, à razão do ritmo das inovações tecnológicas.

Segundo a organização, o tempo de vida de um computador em um país desenvolvido caiu de seis anos em 1997 para dois anos em 2005. O do celular é inferior a dois anos. No Brasil, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações, há mais de 150 milhões de celulares em funcionamento - prontos para virar lixo a qualquer momento.

Tudo isso por conta do que se chama de obsolescência programada. Uma estratégia de mercado que consiste em fazer com que produtos em bom estado sejam simplesmente descartados assim que um modelo mais novo é lançado - somada a apelos da mídia e à nossa cultura consumista.

Além de gerar lixo, o consumo desnecessário aumenta a demanda por recursos e energia na produção dos aparelhos e expõe milhares de pessoas a componentes tóxicos entre os quais berílio, cádmio, mercúrio, ftalatos e chumbo. Isso porque boa parte do e-lixo é manipulado em países em desenvolvimento por pessoas em busca de alguma renda, em processos de desmontagem, reaproveitamento das peças ou reciclagem. São processos que, se não forem feitos sob determinados cuidados, levam à contaminação.

Dalton Martins, professor de sistemas de informação da Faculdade Módulo, faz parte de um grupo que trabalha com reciclagem de aparelhos eletrônicos voltada para a inclusão social, que pode ser conferida em http://lixoeletronico.org/ e http://rede.metareciclagem.org/. Segundo ele, embora os computadores se tornem cada dia mais sofisticados, a imensa maioria das pessoas continua usando interfaces muito simples, como navegação nos sites, redes sociais, acesso a vídeos no You Tube, além de editor de texto e planilha. Para isso, não é preciso ter computadores novíssimos.

Como o Brasil ainda não aprovou a Política Nacional de Resíduos Sólidos, encaminhada ao Congresso Nacional em 2007, as políticas de descarte, destinação e reciclagem do e-lixo estão em aberto.

Enquanto isso, o que o consumidor pode fazer por conta própria? Avaliar a real necessidade de trocar o computador ou celular antigo é uma das primeiras atitudes. Procurar informações sobre a destinação do celular usado (algumas lojas os recolhem) é outra. Também é possível consultar no site do Greenpeace o Guide to greener electronics, que monitora a atuação das maiores empresas (www.greenpeace.org/international/campaigns/toxics/electronics/how-the-companies-line-up). E escolher produtos das empresas com melhores políticas.

Felipe Fonseca, que faz parte da rede Metareciclagem, lembra que outra medida importante é aumentar a vida útil dos aparelhos por meio do reuso. "Um computador de dez anos atrás ainda pode ser usado como servidor de rede, armazenamento ou impressão. O software livre, com a flexibilidade que lhe é inerente, também pode ajudar bastante nesse sentido. Uma terceira maneira de reduzir os danos do lixo eletrônico é buscar um descarte responsável: em vez de jogar os eletrônicos no lixo, procurar projetos sociais e educacionais que façam uso deles, ou então empresas que realizem a remanufatura ou reciclagem dos equipamentos", afirma em artigo publicado na revista NovaE.

Fonseca conta que, juntamente com a rede MetaReciclagem, desenvolveu um modelo experimental de reaproveitamento de eletrônicos, ainda não implementado. Consiste de um ambiente on-line onde pessoas e empresas possam cadastrar os equipamentos que têm para doar, e uma rede de interessados prontas a receber as doações ou transportá-las para outras pessoas ou projetos. Os equipamentos passam por triagem e remanufatura, compartilhadas por uma rede de empreendedores sociais, que podem se apropriar dos materiais. Esse processo otimiza o uso de eletrônicos, aproveitando-os ao máximo antes do envio para a reciclagem.

Segundo ele, em todo o mundo, a reciclagem de eletrônicos é um mercado em crescimento. No Brasil, sem aprovação da política de resíduos sólidos, impera a informalidade. Elogiado em todo o mundo, o projeto de lei trata o lixo eletrônico como resíduo reverso, ou seja, responsabiliza o fabricante pelo manejo dos descartes antes da disposição final um projeto.


Amália Safatle é jornalista e fundadora da Página 22, revista mensal sobre sustentabilidade, que tem como proposta interligar os fatos econômicos às questões sociais e ambientais.